Monday, February 16, 2004

Diálogos com Antonio Abrantes:
> Denis escreve:
>
> "Quando a tecnologia consiste na utilização de certos meios para
alcançar um resultado técnico através da ação sobre a natureza, tem-
se no caso uma patente de processo. Assim, o conjunto de ações
humanas ou procedimentos mecânicos ou químicos necessários para se
obter um resultado (aquecer, acrescer um ácido, trazer o produto a
zero absoluto) serão objeto desse tipo de patente"

> Esta noção de processo me parece ajustada para patentes químicas,
mas inadequada para patentes de software, que usualmente são escritas
como patentes d eprocesso, e fica dificil imaginar como sendo etapas
que envolvem a ação sobre a natureza.

Mas é exatemente esse meu ponto. Vide meu Uma Introdução, 2a. EdiÇão,
p. 338 e seguintes:


Invento é uma solução técnica para um problema técnico. A primeira
constatação é de que a simples cogitação filosófica, a obtenção ou
utilização de conhecimento científico ou a ideação artística não são
invento:


"Questa formula affida la linea di confine tra ciò è e ciò che non è
in sè brevettabile alla contrapposizione tra scienza e tecnica, tra
attività puramente conoscitiva e attività di trasformazione
dell'esistente" [1].


A questão da natureza técnica do invento é central para a definição
do termo, em seu sentido jurídico. Para precisar o alcance do pedido
do privilégio, é necessário declinar o campo técnico no qual o
invento se insere; para que a publicação seja eficaz como pressuposto
da patente, é preciso assegurar que o problema técnico e sua solução
sejam entendidos; as reivindicações descrevem as características
técnicas do invento [2].
Neste ponto, vale lembrar que a noção de "técnico", como minudenciado
adiante, tem especial relevância para a concepção de patente como
prevalece nos países europeus. Como se vê, nos exemplos mencionados
ao falarmos de patentes de business methods, a perspectiva americana
mais corrente (embora isso não acontecesse antes da década de 90') é
de que não existiria, na prática, a exigência de que a solução
protegida exigisse algum tipo de impacto relativo aos fenômenos
naturais.
O que é, assim, técnico? Os tribunais alemães e americanos têm
tratado extensamente da matéria. Para a Suprema Corte da Alemanha,
tal seria o controle das forças da natureza para atingir um fim
determinado [3]; o Tribunal Federal de Patentes do mesmo país definiu
como tal "o efeito de forças naturais sob o domínio humano e da
utilização controlada de fenômenos naturais" [4]. O elemento
conceptual forças da natureza ou estados da natureza parece
especialmente relevante quando se considera a rejeição das idéias
abstratas e procedimentos mentais como sendo invenção.
Nos Guidelines do Escritório Europeu de Patentes, a interpretação do
art. 52 da respectiva Convenção precisa que o invento deva ser
concreto e técnico. Em outras palavras, não pode ser abstrato, nem
não-técnico, entendidas nesta última expressão as criações estéticas
e as simples apresentações de informações.
Não é técnico, assim, o procedimento ou conceito abstrato, não ligado
a uma forma específica de mudança nos estados da natureza. Num
exemplo clássico, Morse viu rejeitada pela Suprema Corte Americana
uma reivindicação de sua patente do telégrafo que dizia:


"I do not propose to limit myself to specific machinery or parts of
machinery described in the foregoing specification and claims; the
essence of my invention being the use of the motive power of the
electric or galvanic current (...) for making or printing
intelligible characters, letters or signs at any distance (...)"[5]
Reivindicando, em abstrato, todos os meios concebíveis para se chegar
ao resultado, Morse teria tentado patentear uma idéia abstrata, o que
não é uma solução técnica.
Também não será técnico o procedimento que importe, para sua
execução, na avaliação subjetiva (inclusive matemática [6]) ou
estética do ser humano, na instância psicológica [7]. A objetivação
de tal avaliação num meio técnico (como o computador) não parece ser
suficiente para assegurar a patenteabilidade da solução em que se
constitui o invento.



[1] Vanzetti e Cataldo, op. cit., p. 285.
[2] Singer, op. cit., p. 111.
[3] Caso Rote Taube, 27/3/69, GRUR 69, p. 672.
[4] Decisão de 15/1/65, BPatGE 6, 145 (147).
[5] O'Reilly v. Morse, 56, U.S. 1, 15 How. 62 (1854).
[6] Guidelines EPO: "les méthodes purement abstraites ou théoriques
ne sont pas brevetables. Par exemple, une méthode rapide de division
ne serait pas brevetable, mais une machine calculatrice construite
pour fonctionner selon cette méthode peut l'être. Une méthode
mathématique permettant d'obtenir des filtres électriques n'est pas
brevetable; néanmoins, les filtres obtenus d'après cette méthode ne
seront pas exclus de la brevetabilité en vertu des dispositions de
l'art. 52(2) et (3)".
[7] In Re Abrahms, 188 F2d 2d. 165 (CCPA 1951). Note-se que o fato de
se tratar de matéria estética ­ livro, ou quadro, não elimina a
possibilidade de invento, desde que as reivindicações recaiam sobre
um objeto que tenha tanto caráter técnico quanto aplicabilidade
técnica. Dizem as Gudelines da EPO: "Par exemple, un livre revendiqué
uniquement en des termes se rapportant à l'effet esthétique ou
artistique de l'information qu'il contient, de sa mise en page ou de
sa fonte ne serait pas brevetable, de même qu'une peinture définie
par l'effet esthétique de son objet, par la disposition des couleurs
ou encore par son style artistique (par exemple impressionniste).
Néanmoins, si un effet esthétique est obtenu par une structure ou par
un autre moyen technique, bien que l'effet esthétique lui-même ne
soit pas brevetable, les moyens de l'obtenir peuvent l'être. Par
exemple, l'aspect d'un tissu peut être rendu attrayant par une
texture comportant un certain nombre de couches et qui n'avait pas
encore été utilisée à cet effet; dans ce cas, un tissu présentant
cette texture pourrait être brevetable. De la même manière, un livre
défini par une particularité technique de la reliure ou de
l'encollage du dos peut être brevetable, même s'il a également un
effet esthétique; il en va de même d'une peinture définie par le type
de la toile, par les pigments ou les liants utilisés. »



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