Thursday, September 08, 2005

Raiva contra a propriedade intelectual


A defesa da Propriedade Intelectual contra os excessos e disfunçoes
não é "raiva contra a propriedade intelectual". Pelo contrário, é
defesa da PI contra os aproveitadores e severinos, que querem, por
desvio e apodrecimento do sistema, fazer que alguns ganhem contra-
direito e a despeito da sociedade. Esse povo que quer, não royalties,
mas mensalão.

"this court has consistently held that the primary purpose of our
patent laws is not the creation of private fortunes for the owners of
patents but is to promote the progress of science and useful arts
(...)", Motion Picture Patents Co.v. Universal Film Mfg. Co., 243
U.S. 502, p. 511 (1917).

Como esse povo paga também honorários, cabe uma observação
sobre ética. Não é só o pirata e o traficante de tóxicos que é
antiético. Todo mundo quer maximar o lucro a despeito do interesse da
sociedade e do direito. Lembre-se o que diz uma decisão do CADE:

Ato de Concentração 83/96. Voto da Conselheira Lúcia Helena Salgado
Não há porque se iludir. Da perspectiva privada, do agente econômico
atuante no mercado, a concorrência é uma fonte de aborrecimento e
pressão. O sonho de toda empresa é tornar-se monopolista e conquistar
uma vida tranqüila e não seria racional se não fosse dessa maneira.
Stigler, um dos expoentes da escola de Chicago, em passagem
interessante, diz:
"A competição ... é por amplo e antigo consenso altamente benéfica
para a sociedade quando imposta - sobre os outros. Toda indústria que
pode bancar um porta-voz tem enfatizado ao mesmo tempo sua devoção a
esse princípio geral e a necessidade prioritária de reduzir a
competição dentro de seu próprio mercado, porque nesse caso a
competição não funciona bem...."

Mas discordo dele no que diz que nem tudo que é lícito é moral. Com a
incorporação dos valores à interpretação constitucional, simplesmente
esse excesso da lei ordinária, a que ele se refere, é textual ou
praxisticamente antiético, mas não é lícito. À luz do Direito, no
qual a Constituição é suprema - como prática e não só como lábaro que
se ostenta estrelado - essas práticas são consitentemente ilícitas.

Por isso que a PI, antes de tudo, e inexoravelmente,deve ser aplicada
através de sua iluminação pela Carta em vigor. Há desequilíbrio de mais
no ar.

A propósito (deixando o problema e ingressando nas metáforas da
ilustração), discordo da posição da OAB nacional de limpar a atual
cavalariça de Auguias através de uma nova constituinte. Constituiçã
o não é texto, é principalmente prática. A OAB anda saudosa de golpes
ao estilo de 1964, tipo Redentora, e golpes civis não são melhores
dos que os castrenses.

Wednesday, July 27, 2005

Conversa com o Abrantes sobre período de graça



> Denis, voce propoe uma interpretação diferenciada do artigo 12
inciso III para a pequena e para a grande empresa ? Isto me parece
bastante problemático, até do ponto de vista prático onde os limites
do grande e pequeno não são tão claros muitas vezes. A diferenciação
por nacional e estrangeiro me parece claramente contrária a Convenção
de Paris.

Respondendo ao Abrantes:

O que propugno não é uma proteção tipo Sebrae. Isso, sim, teria que
ter previsão em lei, como bem nota o Gabriel. O que eu digo
é: "Assim, a interpretação de seu teor levará em
conta a exigência constitucional de balanceamento entre interesses
contrastantes, sem perder de vista à proteção ao mais fraco, que pode
ser o inventor, mas também sem frustar os interesses da comunidade,
que é de ter a tecnologia de uso livre, ou logo publicada para
conhecimento público."


A aplicação do balanceamento de interesses constitucionais, como
indico nesse texto ai, não é em abstrato. Meu exemplo (que dou logo
em seguida no mesmo texto) de negativa de graça às médias e grandes
empresas é apenas ...um exemplo. "Assim, nenhuma contemplação poderá
haver no caso de invento de titularidade uma grande ou média empresa
que descura de pretender proteção a seus inventos; dormientibus non
soccurit jus." Aplica-se a graça como forma de mitigar uma
inferioridade real, caso a caso, na concretude das circunstâncias.


É essa a singularidade da aplicação de princípios. Nào é um
procedimento de subsunção de caso à regra. É uma aplicação de um
balanceamento de interesses, ponderando-os de forma a melhor aplicar
a norma segundo sua finalidade, na concretude do caso. Ou seja, é
diícil, mas não impossível, que uma grande empresa (jejuna de PI,
ignorante e iniciante em tudo) mereça a graça, como é possível que o
inventor singular, escolado e safado, não a mereça. Mas graça é
graça, como aliás o nome precisa.


Notem que não sou nem de longe o primeiro a aplicar uma análise de
princípios, e não de regras, à PI. Quem primeiro, e muitissimo bem,
interpretou o CPI/96 além do texto da regra, para bem aplicar o
balanceamento constitucional, caso a caso, foi Gustavo Leonardos:


Gustavo Leonardos, em A Perspectiva dos Usuários dos Serviços do INPI
em Relação ao Registro de Marcas sob a Lei 9.279/96. Revista da
Associação Brasileira da Propriedade Intelectual - ABPI Anais do XVII
Seminário Nacional de Propriedade Intelectual, 1997:
"A publicidade comparativa que obtenha sucesso, não vai forçosamente
prejudicar a reputação ou integridade da marca comparada? Mesmo a
despeito da veracidade e correção da informação ou comunicação
publicitária (artigo 38 do Código do Consumidor)? Ou nesta última
hipótese poderíamos considerar que há uma inversão do equilíbrio
entre as garantias constitucionais previstas nos incisos IX ("é livre
a expressão da atividade…de comunicação") e XXIX ("a lei assegurará…
proteção… à propriedade das marcas") do artigo 5º da Constituição
Federal? Se afirmativa a resposta à última pergunta, podemos afirmar
que para se dar esta inversão favorável ao anunciante deverá ser
observada a prevalência do conteúdo informativo do reclame sobre as
demais mensagens, inclusive implícitas, de caráter emotivo ou
deceptivo. Caso contrário, haverá a validação da concorrência
desleal, do uso indevido de marca alheia, através da propaganda
comparativa."
Títulos de Software
Conversa com Maria Alice Calliari, INPI

Prezado Denis:
Algumas dúvidas sobre o software:
O título do software também é protegido como direito autoral, considerando aleitura da proteção do objeto como obra literária ressalvando asespecificidades da legislação própria. Nesse sentido o título da obra(software) teria que ser novo perante o estado da técnica?


Não. Diz o nosso Ascenção no seu Direito de Autor e Direitos Conexos, Coimbra, 1993:

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" Por este prisma, os títulos dividem-se em três categorias:

-os que são protegidos como obras;
-os que não são protegidos;
- os que são protegidos como títulos.
(...) em casos relativamente raros o título tem em si este significado. «Todos os anos, pela Primaveras ou «.Anoitecendo, a vida recomeça" são já de si pequeninas obras. Só nestes casos merecem uma protecção autonomamente inspirada no direito de autor

Isso vale para todos os sistemas jurídicos.

Vamos ver o que a nossa LDA fala de títulos:

Lei 9.610/98 Art. 8º Não são objeto de proteção como direitos autorais de que trata esta Lei: VI - os nomes e títulos isolados; Lei 9.610/98 Art. 10. A proteção à obra intelectual abrange o seu título, se original e inconfundível com o de obra do mesmo gênero, divulgada anteriormente por outro autor.
Parágrafo único. O título de publicações periódicas, inclusive jornais, é protegido até um ano após a saída do seu último número, salvo se forem anuais, caso em que esse prazo se elevará a dois anos.

Lei 9.610/98 Da Edição Art. 53. Mediante contrato de edição, o editor, obrigando-se a reproduzir e a divulgar a obra literária, artística ou científica, fica autorizado, em caráter de exclusividade, a publicá-la e a explorá-la pelo prazo e nas condições pactuadas com o autor. Parágrafo único. Em cada exemplar da obra o editor mencionará: I - o título da obra e seu autor; II - no caso de tradução, o título original e o nome do tradutor;

Lei 9.610/98 Capítulo VIII Da Utilização da Obra Coletiva Art. 88. Ao publicar a obra
coletiva, o organizador mencionará em cada exemplar: I - o título da obra;

Lei 9.610/98 Da Utilização de Fonograma Art. 80. Ao publicar o fonograma, o produtor mencionará em cada exemplar: I - o título da obra incluída e seu autor;

Lei 9.610/98 Art. 81. (...) § 2º Em cada cópia da obra audiovisual, mencionará o produtor: I - o título da obra audiovisual;


Assim, a proteção só abrange os títulos originais. O que é isso?

Originalidade é coisa que tem múltiplos significados em PI. Dissemos, em Uma Introdução,2a. Ed., falando de DIs:

A “originalidade” tem variada conceituação em Direito da Propriedade Intelectual . No Direito Autoral, tende a se manifestar como a característica de ser oriunda do próprio criador , ou novidade subjetiva.

Lê-se do que dissemos que no DA a palavra tende ser tomada como "a característica de ser oriunda do próprio criador , ou novidade subjetiva".


Mas é apenas uma observação de caráter analógico. Vamos à análise.

O primeiro sentido que a palavra aparece no DA é o da simples novidade.

"
haja originalidade nessa concepção, entendida a palavra no sentido relativo, ou
seja, de que não se cuida da novidade absoluta, mas de concepção diversa das
existentes.” BITTAR, Carlos Alberto. O Direito do Autor. In Revista
EPM-APAMAGIS, nº 1 (2), jan-abr, 1997, p. 60


O segundo sentido, o de imputação subjetiva, ocorre também, de acordo com contexto. Por exemplo, a Lei 9.609 diz:

Art. 3º. Os programas de computador poderão, a critério do titular, ser registrados em órgão ou entidade a ser designado por ato do Poder Executivo, por iniciativa do Ministério responsável pela política de ciência e tecnologia. § 1º O pedido de registro estabelecido neste artigo deverá conter, pelo menos, as seguintes informações:
I - os dados referentes ao autor do programa de computador e ao titular, se distinto do autor, sejam pessoas físicas ou jurídicas;
II - a identificação e descrição funcional do programa de computador; e
III - os trechos do programa e outros dados que se considerar suficientes para identificá-lo e caracterizar sua originalidade, ressalvando-se os direitos de terceiros e a responsabilidade do Governo
. Quanto ao software, propriamente dito, entendo que esta "originalidade" tenha um sentido próprio. Por exemplo, falando do registro de programa disse (O registro do programa, 1998):

O primeiro objetivo do depósito é a comprovação de que o programa é criação
independente, ou seja, resultante de elaboração autônoma. É o requisito clássico
da originalidade (subjetiva), que está para o sistema do Direito Autoral como o
de novidade (objetiva) está para o sistema de patentes 1. Tal comprovação seria
efeito, possivelmente, da prioridade no registro, dentro do princípio prius in
tempore, fortior in jure
1 Claude Colombet, op. cit., pg.36
No entanto, uma vez mais cabe repetir que o registro é constitui prova juris tantum; não só pode ser superada por outra evidência, como também, no caso da legislação autoral, aqui aplicável, a criação anterior não tira a originalidade da posterior, desde que não tenha havido indevida apropriação de material da primeira pela segunda criação.

Veja um parecer que dei na Procuradoria do INPI, quando era PG, falando do software em si mesmo, e não de seu título:


Originalidade

Derivações Art. 5º Para os efeitos desta Lei (9.610), considera-se:
VIII - obra: f) originária - a criação primígena; g) derivada - a que,
constituindo criação intelectual nova, resulta da transformação de obra
originária;

Originalidade – Parecer

INPI, 1988

“O regime pertinente é o genérico do Direito Autoral, modificado pelas disposições da Lei 7.646. Ora, em tal regime não se exige a novidade objetiva como requisito de proteção, mas tão somente a originalidade - conceito que tem acepção muito peculiar neste contexto.
De um lado, nem tudo que é subjetivamente original é protegido - como nota a Lei 7.646 (Art. 7o.,III) ao absolver de plágio a criação que se aproxima a outra porque as formas alternativas de expressão são limitadas. Se as características do hardware impõem uma e só uma solução de software, não há direito autoral sobre esta, ainda que tenha havido criação original. De outro lado, a recriação independente de uma obra objetivamente já existente faz jus à proteção autoral.
Assim, não é a comparação objetiva entre uma obra anterior e uma posterior que poderá ferir a originalidade da segunda; somente uma análise minuciosa do processo criativo poderá chegar a tal conclusão. Além disto, mesmo quando original, uma obra pode ser dependente de outra que lhe é anterior - como ocorre nas traduções. Quando isto ocorre, há uma obra original, mas derivada da anterior; e tal noção é muito relevante porque obra derivada, na nossa lei autoral, só pode ser explorada com a permissão do titular da obra originária - a da qual se deriva a segunda obra original.
Esta originalidade, chamada relativa, pode existir seja quanto à expressão da obra (outra vez: como na tradução), seja quanto a sua composição (a forma interna: a ordenação e disposição da obra), mas inexistir quanto ao outro elemento. Para se apurar se há originalidade absoluta ou relativa, assim, é preciso analisar em cada caso se o segundo criador baseou-se nas idéias em geral, que são de domínio público; ou na análise formal-matemática do problema tecnológico a ser resolvido pelo programa de computador, igualmente em domínio público; ou na formulação
lógico-matemática de tal análise, o chamado algoritmo, ainda de domínio comum; ou se já nas ordenações e disposições do programa que, não sendo de caráter necessário, representem uma escolha entre alternativas possíveis, assim uma parte da forma interna da obra - sua composição. É tarefa difícil.

Original é - neste sentido - simplesmente o que foi criado pelo autor, sem nenhuma avaliação de estado da arte ou de uso e registro prévio.

Mas um terceiro sentido existe para a palavra em DA. Por exemplo, a da existência de um conteúdo mínimo de doação pessoal, que faça de uma trabalho uma obra do espírito e não simplesmente o resultado do tempo e do suor despendido.

É nesse sentido que Henri F. Jessen, entende que os requisitos para proteção da obra são: a) pertencer ao domínio das letras, das artes ou das Ciências; b) ter originalidade; c) achar-se no período de proteção fixado pela lei. (JESSEN, Henri Francis. Direitos Intelectuais: Ed. Itaipu, RJ, 1967).

Vide, neste entendimento, Proteção Autoral do Website Manoel J. Pereira dos Santos, Revista da ABPI n. 57 1/3/2002, falando do regime brasileiro de bases de dados, evocando por compração o sistema europeu da diretiva nº 96/9/CE, de 11 de Março de 1996:

A principal diferença entre a proteção das bases de dados originais e aquela advogada para as chamadas bases de dados não originais está no fato de que, no primeiro caso, o conjunto é protegido, não enquanto simples acervo de dados e outros materiais, mas sim na medida em que há a sistematização, organização e disponibilização desses elementos de forma criativa, não se estendendo a proteção autoral aos dados e materiais em si mesmos. Já no segundo caso, o âmbito dessa proteção é maior, abrangendo o acervo de dados e outros materiais, sendo assim preferível designar esse sistema como de proteção do conteúdo das bases de dados.

O que não é necessariamente um requisito geral de todas as práticas autorais:

RE-30406 / GB RECURSO EXTRAORDINARIO . Relator Ministro VICTOR NUNES - Publicação DJ DATA-25-05-66 PG-Julgamento 11/04/1966 - PRIMEIRA TURMA Ementa - 1) O ANOTADOR DE LEIS, MESMO SEM ORIGINALIDADE DOUTRINARIA, TEM A PROTECAO DO DIREITO AUTORAL.

A quarta accepção - a que nos interessa - é de distinguibilidade. Neste sentido, retornando ao meu texto sobre DIs:

Pela definição do CPI/96, assemelha-se à distinguibilidade do direito marcário (vide abaixo), ou seja, a possibilidade de ser apropriada, já que não está imersa no domínio comum. A fragilidade de tal conceito está na extrema proximidade com a noção de novidade, acima definida.

Diz Newton Silveira:

(...) a originalidade é condição tanto para a proteção das invenções, quanto das obras artísticas, podendo-se dizer que nas obras de arte a originalidade se refere à forma considerada em si mesma, enquanto que para os modelos e desenhos industriais a forma em si pode não ser original, desde que o seja a sua aplicação, isto é, a originalidade neste caso consistiria na associação original de uma determinada forma a um determinado produto industrial .

Em Direito Francês, exige-se que o desenho tenha “uma configuração distintiva e reconhecível que a diferencie de seus similares” . Já a proposta de diretriz da Comunidade Européia, em seu art. 3.2, prevê a satisfação do requisito de caráter individual, definido como o atributo que faz o observador, numa impressão global, determinar que o objeto protegido difere de maneira significativa dos outros desenhos utilizados ou publicados no território.

Tal caráter distintivo, de novo no Direito Francês, terá de ser visível e claramente aparente, possibilitando o objeto diferenciar-se dos congêneres seja por uma configuração reconhecível, seja por vários efeitos exteriores que lhe empreste fisionomia própria (Code de la Propriété Intellectuelle, art. L.511-3).

À luz de tais parâmetros, entendo que o requisito, em sua nova roupagem, deva ser entendido como a exigência de que o objeto da proteção seja não só novo, ou seja, não contido no estado da arte, mas também distintivo em face desta, em grau de distinção comparável ao ato inventivo dos modelos de utilidade .

Autores há que entendem haver distinções nesse requisito conforme o setor produtivo e o mercado consumidor; assim, para certos produtos, a distinguibilidade deveria ser maior, assim como em face de um consumidor mais sofisticado, o impacto do efeito estético deveria se afeiçoar a essa característica.

Note-se o que ocorre, por exemplo, no contexto da proteção dos semicondutores:

House Report 98-781, 96th. Cong. 2nd. Sess. 4 (1984), p. 17: "a mask work is original if it is the independent creation of an author who did not copy it". Segundo o 17 USC Par. 902 (b), "the mask work may not consist solely of designs that are staple, commonplace or familiar in the semiconductor industry, or variations of such design, combined in a way that, considered in a whole, is not original". Copyright Office Circular R 100.

Voltemos ao Ascenção. Diz ele (p. 601)

Não são protegidos os títulos que não forem originais, dispõe o art. 4.011. Esta qualificação deve ser interpretada. Se se entendesse a originalidade no sentido da criatividade que caracteriza a obre literária, exigir-se-ia para a protecção do título que ele fosse por si obra literária. Mas assim, estaria a confundir-se a protecção do título da obra com a protecção do título como obra.No art. 40;'1, a originalidade significa. simplesmente a não banalidade. O título é protegido desde que traga algo de novo. Isto resulta do n .O 2, onde se afirma que se considera que não .satisfazem estes requisitos os títulos que enumera.

Podemos indicar vários títulos nestas condições: 1) Os que designam uma categoria, como *Manual de lnformática, ou sé tomaram de qualquer modo designação usual.2) Títulos constituídos por normes de personalidades reais ou até mitológicas, como *Orfeu*.3) Títulos comuns, como *Pas-de-deux" para urna dança, *Contraluz» para uma fotografia, ou "Composição" para uma pintura.

Resta a generalidade dos títulos. São aquela que, não sendo por si obras literárias, não são banais ou genéricos. Tem por isso capacidade caracterizadora.

São estes os títulos previstos no art. 4.011, sob a qualificação de originais, e os que nos interessarão de seguida.
Isto nos permite uma tripartição dos títulos em:-- criadores; -- genéricos; -distintivos (s).

Mas não basta, para a proteção do título, que ele seja orginal. É preciso, ainda que ele seja "inconfundível com o de obra do mesmo gênero, divulgada anteriormente por outro autor"
O requisito aqui é de novidade relativa, apurada em face da divulgação anterior (não da criação, não do uso privado) de obra de outro autor.

Mais uma vez, e longamente, Ascenção:

(...) o art. 4.0A exige cumula­tivamente que o título «seja original e não possa confundir-se com o título de qualquer outra obra do mesmo género anteriormente divulgada ou publicada», A originalidade caracteriza o título por si, enquanto que a nao confundibilidade o caracteriza na relaçâo com outros títulos.
Uma vez que se exige a novidade, tem de se indicar o marco em que essa novidade se aprecia. É o momento da divulgação. Nâo tem importãncia que o autor tenha realizado uma auténtica tarefa de criação intelectual; se se verificar que há possibilidade de contusão com outro título, que ele porventura desconhecerá, já não poderá usar o título que criou. Mesmo que a sua criação tenha sido anterior, e ele possa prová-lo; basta que outrem se tenha adiantado na utilização para que ele esteja impedido de usar o titulo.
Ainda, Pode não haver no título o mínimo de criação; por exemplo, imaginemos que o escritor denomina o seu romance "A Sagração da Primavera» Como esse título foi utilizado em obra musical e não literária, a utilização é livre. Isto confirma ulteriormente que não há no título a exigência de criação, própria da obra literária ou artística.

Enfim, o último requisito - o de "obra do mesmo gênero"

Esta distinguibilidade se apura em face de uma limitação de campo similar à especialidade marcária, mas não é vinculada, como na marca, a uma mercado específico, mas a um gênero. Embora essa palavra tenha várias acepções, neste contexto significa "o mesmo tipo de obra", tendo como exemplo "no gênero drama, tragédia, transmissão e exibição cinematográfica" (art. 6o.), não-audiovisual, em face de obra desse tipo (art. 85) .

Ascenção:

A lei exige a não confundibilidade com o título de qualquer outra obra *do mesmo género". Assim, o titulo de urna ópera pode sem limitação ser utilizado numa poesia, ou o título de um fime de um filme num quadro.De outras vezes a delimitação do género não é clara. Romance e obra teatral são géneros diferentes, mas isso não pode significar que os títulos sejam reciprocamente apropriáveis.

Pensamos que há que pôr o acento, mais que numa distinção dos géneros em abstracto, na própria susceptibilidade de confusão, que é a ratio da regra.O critério fundamental é o da coofundibilidade. Saberemos sr um género é diferente ou não consoante subsista a possibilidade ene confusão de obras.

Ninguém vai confundir uma pintura e um bailado por ambos se chamarem «Estados de alma», mas a confusão já poderá estabelecer-se entre uma sinfonia e um bailado. Se o público pode ser induzido em erro, no seu olhar distraído, pela identidade ou semelhança dos títulos, diremos que são do mesmo género.

Não basta assim o apelo que um nome conhecido suscita; nem a mera ignorância individual. A confundibilidade tem de se apurar perante o destinatário médio, c portanto (leve basear-se em valorações objectivas.

Com razão escreve por isso Ilubmann: »Há susceptibilidade de confusão não só quando o título é utilizado para obras da mesma espécie como ainda quando é utilizado para obras de espécies diversas. Assim, os títulos de livros e de filmes são susceptíveis de confusão, porque a mesma designação nduz o público à convicção errónea de que o filme representa uma adaptação do livro; também títulos de televisão e de cinema são susceptiveis de confusão entre si» ('). Estas afirnaçóes são acompanhadas das referéncias jurisprudenciais que as sustentam (_).

O titular de um software poderia além do título protegido por DA também teruma marca registrada para o seu produto?

Sim. Mas, vale revisitar Ascenção:

Um titulo, mesmo que protegido helo Direito de Autor e Direitos Conexos, pode ainda ser protegido por outros ramo,. Pode ser protegido pela concorrência desleal, se o uso do título representar um acto de concorrência entre empresas; e pode ser protegido pelo Direito das Marcas.

Esta última hipótese verifica-se apenas quando se trate de uma obra cuja conteúdo seja variável (r). A obra única, como o livro, não tem marca; mas pode té-la a obra que se divide em fracções, como a série televisiva. O título pode aí revestir as característìcas de marca, assegurando a identidade daquele produto ou serviço- i então possível recorrer, cumulativamente, à tutela pelo Direito das Marcas.

Podemos dizer que o requerente de um pedido de registro de programa decomputador é um "depositante", passando a denominálo "titular" somente após apublicação da concessão do registro na RPI?


Não A titularidade da obra precede o registro. Ele é titular antes (se o for) e o é depois. Ou não é, com ou sem registro.


Grata pela antenção,
Abs,
Maria Alice Camargo CalliariCoordenadora Geral de Outros RegistrosDiretoria de Contratos de Tecnologia e Outros RegistrosTel: (55 21) 2139-3212 - Fax: (55 21) 2139-3175

Monday, February 28, 2005

TRIPS não exige de ninguém que emita modelos
de utilidade. Nem Expressões e sinais de propaganda. Nem garanta
proteção especial de marcas à União dos Escoteiros do Brasil. Essas
peculiaridades nacionais, que estão longe de ser universais, escapam
ao escopo do tratado, sob o princípio "quod abundat non nocet"
O art. 27 de TRIPs (cuja importância é retoricamente ampliada até a
próxima galáxia) simplesmente diz:
"1 - Sem prejuízo do disposto nos parágrafos 2 e 3 abaixo, qualquer
invenção, de produto ou de processo, em todos os setores
tecnológicos, será patenteável, desde que seja nova, envolva um passo
inventivo e seja passível de aplicação industrial..(...)
Enquanto "ato inventivo" (seja o que for que isso signifique no seio
do Deus Tupã) e passo inventivo forem coisas diferentes, simplesmente
o art. 27 não se aplica aos modelos de utilidade, e o artigo do Sr.
Dick von Teufelein pode ser apenas mais uma dessas papagaiadas de
doutrina interesseira.
A lei 9.279/96, em seu art. 12, numa interessante inovação sobre o
sistema anterior, considera não ferir a novidade a divulgação do
invento, quando ocorrida durante os doze meses que precederem a data
de depósito ou a da prioridade do pedido de patente, se promovida
pelo próprio inventor (o chamado período de graça), pelo INPI em
publicação oficial do pedido de patente depositado (por outras
pessoas, que não o inventor, obviamente) ou por terceiros, com base
em informações obtidas direta ou indiretamente do inventor ou em
decorrência de atos por este realizados .
Neste último caso, estará também a divulgação feita por outros entes
públicos, nacionais ou não, inclusive a publicação por escritórios de
patente estrangeiros, ou pelo titular do direito de pedir patente. O
dizer da lei, "direta ou indiretamente", abrange toda e qualquer
comunicação do teor do invento, deliberada ou não, obtida dolosa ou
culposamente, ou ainda sem qualquer culpa. Só se exclui da regra
geral do art.12 a divulgação de informações independentes, a de um
invento autônomo.
Como já se indicou, o período de graça é objetivo, e sua proteção não
é afetada pelo descuido ou falta aparente ou real de intento em
proteger o valor econômico do invento. Porém, não obstante o intuito
protecionista do instituto, voltado ao inventor individual ou pequena
empresa que ­ historicamente ­ tendem a perder o direito de pedir
patente por divulgarem o invento antes do depósito, o que se tem
neste dispositivo é uma suspensão do período em que a tecnologia cai
em domínio público. Assim, a interpretação de seu teor levará em
conta a exigência constitucional de balanceamento entre interesses
contrastantes, sem perder de vista à proteção ao mais fraco, que pode
ser o inventor, mas também sem frustar os interesses da comunidade,
que é de ter a tecnologia de uso livre, ou logo publicada para
conhecimento público.
Assim, nenhuma contemplação poderá haver no caso de invento de
titularidade uma grande ou média empresa que descura de pretender
proteção a seus inventos; dormientibus non soccurit jus. Para estes,
há que se aplicar o período de graça com o máximo de restrição.
Importantíssimo, neste contexto, é a prova do momento do invento.
Para satisfazer o requisito do prazo, convém aplicar os exatos
parâmetros de verificação de anterioridade, acima expostos, ainda que
com a ênfase oposta.
Notam vários autores do risco que é utilizar-se deste recurso da Lei.
9.279/96, eis que em muitos países não se concede o período de graça:
quanto a eles, o exercício do direito assegurado pela lei nacional
importaria, em seus sistemas jurídicos, em perda da novidade.

O que propugno não é uma proteção tipo Sebrae. Isso, sim, teria que
ter previsão em lei.
O que eu digo é: "Assim, a interpretação de seu teor levará em
conta a exigência constitucional de balanceamento entre interesses
contrastantes, sem perder de vista à proteção ao mais fraco, que pode
ser o inventor, mas também sem frustar os interesses da comunidade,
que é de ter a tecnologia de uso livre, ou logo publicada para
conhecimento público."
A aplicação do balanceamento de interesses constitucionais, como
indico nesse texto ai, não é em abstrato. Meu exemplo (que dou logo
em seguida no mesmo texto) de negativa de graça às médias e grandes
empresas é apenas ...um exemplo. "Assim, nenhuma contemplação poderá
haver no caso de invento de titularidade uma grande ou média empresa
que descura de pretender proteção a seus inventos; dormientibus non
soccurit jus." Aplica-se a graça como forma de mitigar uma
inferioridade real, caso a caso, na concretude das circunstâncias.
É essa a singularidade da aplicação de princípios. Nào é um
procedimento de subsunção de caso à regra. É uma aplicação de um
balanceamento de interesses, ponderando-os de forma a melhor aplicar
a norma segundo sua finalidade, na concretude do caso. Ou seja, é
diícil, mas não impossível, que uma grande empresa (jejuna de PI,
ignorante e iniciante em tudo) mereça a graça, como é possível que o
inventor singular, escolado e safado, não a mereça. Mas graça é
graça, como aliás o nome precisa.

Notem que não sou nem de longe o primeiro a aplicar uma análise de
princípios, e não de regras, à PI. Quem primeiro, e muitissimo bem,
interpretou o CPI/96 além do texto da regra, para bem aplicar o
balanceamento constitucional, caso a caso, foi Gustavo Leonardos:
Gustavo Leonardos, em A Perspectiva dos Usuários dos Serviços do INPI
em Relação ao Registro de Marcas sob a Lei 9.279/96. Revista da
Associação Brasileira da Propriedade Intelectual - ABPI Anais do XVII
Seminário Nacional de Propriedade Intelectual, 1997:
"A publicidade comparativa que obtenha sucesso, não vai forçosamente
prejudicar a reputação ou integridade da marca comparada? Mesmo a
despeito da veracidade e correção da informação ou comunicação
publicitária (artigo 38 do Código do Consumidor)? Ou nesta última
hipótese poderíamos considerar que há uma inversão do equilíbrio
entre as garantias constitucionais previstas nos incisos IX ("é livre
a expressão da atividade…de comunicação") e XXIX ("a lei assegurará…
proteção… à propriedade das marcas") do artigo 5º da Constituição
Federal? Se afirmativa a resposta à última pergunta, podemos afirmar
que para se dar esta inversão favorável ao anunciante deverá ser
observada a prevalência do conteúdo informativo do reclame sobre as
demais mensagens, inclusive implícitas, de caráter emotivo ou
deceptivo. Caso contrário, haverá a validação da concorrência
desleal, do uso indevido de marca alheia, através da propaganda
comparativa."

A igualdade, como é óbvio, não implica em igualar desiguais, e - na
fórmula absolutamente precisa de Aristóteles - não há desigualdade
quando desiguais são tratados na proporção da desigualdade existente
entre eles [1]. Diz Celso Antônio Bandeira de Mello [2]:
"as discriminações são recebidas como compatíveis com a cláusula
igualitária apenas e tão somente quando existe um vínculo de
correlação lógica entre a peculiaridade diferencial acolhida, por
residente no objeto, e a desigualdade de tratamento em função dela
conferida, desde que tal correlação não seja incompatível com os
interesses prestigiados na Constituição".

Nào me tenho por mais douto em constitucional do que os colegas, mas
como procurador aposentado, encarregado em sua carreira quase que
exclusivamente de matéria constitucional, tive de aprender a tratar
dessas coisas - à força. Em suma, um tarimbeiro fazedor de ADINS, de
vetos, sanções e pré-questionamentos.
Segundo o
direito constitucional corrente - pelo menos na vertente UERJ que
anda predominando no STF -, cabe ao intérprete ou aplicador da lei
decidir quando se pode discriminar para assegurar o cumprimento do
mandamento constitucional da igualdade. A interpretação
constitucional, especialmente dos princípios, e desses em especial o
de igualdade, não presume a aplicação exclusiva e mecânica de
uma "regra" legal.
Até há uns doze meses atrás, eu atroava os ares com a posição
de que a legitimidade democrática presume voto majoritário.
Mas fui impactado pela doutrina constitucional corrente, nem de longe
só brasileira, segundo a qual a judge-made law tem igual e talvez
superior pestígio - especialmente, de novo, no caso de aplicação de
princípios. Confesso que, em particular desde ontem, a imponência do
princípio majoritário está me parecendo muito pouco convincente.
Ainda me doi aceitar essa realidade da jurisprudência daqui e de
quase toda parte, mas, como dizia Ulysses (não o de Ítaca...), contra
fatos não há argumentos. Neste momento, estou engajado numa
iluminadora pesquisa sobre o direito constitucional comparado da
propriedade intelectual, e a jurisprudência americana, européia
(especialmente da Corte de Direitos Humanos), a alemã, a italiana,
a...colombiana....(!!!) é interessantíssima. É jurisprudência de
princípios e não de regras. Até fim de março tem de sair um texto
sobre isso. Vai sair.

Pois, à luz da realidade do direito como ele existe agora, aí fora na
concretude da prática, e sem considerar os desejos de uma igualdade
formal que assegurasse mais segurança jurídica do que justiça, eu
subscrevo sem medo o texto que mandei na mensagem de hoje. Que
escrevi, aliás, em 2002. Quando minha posição ideológica a favor do
princípio majoritário estava em briga com a aplicação que propugnava
da regra do período de graça.
Agora, pacificado internamente nessa matéria pela atrição dos fatos
da vida, não tenho dúvida quanto ao que escrevi. Ou seja, uma regra
de proteção aos menos capacitados, em matéria de direito de exceção,
como é a Propriedade Intelectual, não pode ser aplicada de forma a
inverter - não os propósitos do legislador - mas a funcionalidade
constitucional. Ou seja, essa coisa de usar período de
graça para dar volta em escorregada de perda de prazo de prioridade é
excelente advocacia, mas péssimo direito.