Thursday, December 23, 2004

Como alguns de vocês já me ouviram dizer, a intervenção da Anvisa
como colaboração é sempre bem vinda; mas a anuência - no sentido de
consentimento - é inconstitucional. Decisões políticas quanto a
patentes são tomadas, exclusivamente, pelo Congresso Nacional, em
sentido genérico e em obediência aos princípios da isonomia do art.
5o. caput da Carta e (se for o caso e o Congresso quiser) às regras
de tratamento nacional dos tratados.
Não sou pessoalmente partidário de dar patentes para segundo uso
farmacêutico, aliás nem de primeiro. E acredito, com toda razão de
fazê-lo, que essas patentes vão contra o interesse nacional. Por
enquanto...
Acho que vale sempre lembrar a decisão da Corte Constitucional da
Itália de que entendeu que - a) depois que a industria nacional
italiana já estava capacitada a concorrer e b) o Estado já dava um
incentivo razoável à pesquisa; e c) os benefícios econômicos do
Mercado Comum já tinham tirado a Itália da miséria e do
subsenvolvimento dos filmes do realismo pós-guerra - a negativa de
patentes PASSAVA A SER INCOSTITUCIONAL.......:
In realtà, negli ultimi anni la presa di coscienza della sopravvenuta
mancanza di ogni fondamento razionale della deroga é cresciuta di
pari passo con l'affermarsi del valore della ricerca scientifico-
tecnica e del dovere della Repubblica di promuoverla; con la più
elevata capacità dell'industria farmaceutica italiana di organizzare
la ricerca, anche in rapporto alle condizioni di competitività con
quella degli altri paesi; ed infine con le più intense relazioni con
i mercati esteri, particolarmente nell'ambito degli stati
appartenenti alla organizzazione del Consiglio d'Europa ed a quella
della Comunità economica europea (come é attestato dalle convenzioni
stipulate dal governo italiano, tutte orientate a restringere o a
eliminare radicalmente la possibilità di vietare la brevettazione in
singoli settori).
A decisão é interessantíssima: ao falar de "sopravvenuta mancanza", a
Corte diz que o que era constitucional antes (negar patentes a
farmacêuticos) passa a não ser depois, sem mudança de texto seja na
Carta seja na lei ordinária, porque as situações de fato se
alteraram.
A meu ver, esta avaliação teria de ser feita não pela Corte mas pelo
Congresso; como o Procurador Geral da República está sustentando no
caso de anencefalia decidido (quanto à liminar)ontem, decisões como
esta não podem ser tomadas pelo Supremo (italiano ou brasileiro).
Mas o que não vai mudar, o Congresso querendo ou não, eu achando que
se deva negar patente a primeiro, segundo ou undécimo uso
farmacêutico, o nosso Ivan Alehrt achando o contrário, é que a nossa
Constituição não permite ao INPI, ANVISA, ao Gilberto Gil ou a
qualquer instituição administrativa exercer poder discricionário na
hora de dar patente.
Quem inventa, do simples ato de criação, tem um direito subjetivo
constitucional a obter sua patente, nos termos prescritos pela
Constituição e pela lei votada pelo Congresso, e esse direito não
pode ser denegado pela avaliaÇão caso a caso de nenhum autoridade
pública. O poder da autoridade pública é de examinar os pressupostos
constitucionais (existência de invento, novidade, atividade
inventiva, suficiência descritiva e industrialidade)e os legais (art.
18 do CPI/96) e DECLARAR SUA EXISTÊNCIA. Só. O poder é vinculado com
correntes de tungstênio.
Tenho o mais rematado respeito ao magistério da Prof. Maristela
Basso, de cuja doutrina eu aprendo em todos os casos, e com cuja
visão maior de Direito tenho sempre me ajustado entusiasticamente.
Neste caso da anuência da ANVISA, porém temos um dessas diferenças
vivificantes de opinião quanto à interpretação constitucional.
Diferença tática apenas.
Acredito que se deva trazer a decisão das matérias relativas à
Propriedade Intelectual ao palco maior da democracia e da
constitucionalidade. Fui militante da guerra de guerrilhas do
nacionalismo tecnocrático por vinte anos; agora, entendo que as
instituições não comportam mais um guevarismo anvisiano, mas exigem
que se discuta, no espaço cruento do Supremo, se a prorrogação de
patentes ao argumento da aplicação do TRIPs atenta, ou não, contra o
ato jurídico perfeito e o direito adquirido.
Para sair do tom muito formal: hoje em dia estou acreditando no lema
verfassungsrecht über alles.

No comments: