Friday, March 04, 2011

A Ministra e o conservadorismo suicida

A questão da "Classe artística" neste contexto da Ministra (o Sader, que é do ramo, diz ser autista, o que aliás é discriminatório e ofensivo mesmo sendo um excelente jogo de palavras) me lembra muito o que se disse no 18 de Brumário de Luis Bonaparte:

Os pequenos camponeses constituem uma imensa massa, cujos membros vivem em condições semelhantes mas sem estabelecerem relações multiformes entre si. Seu modo de produção os isola uns dos outros, em vez de criar entre eles um intercâmbio mútuo... Na medida em que milhões de famílias camponesas vivem em condições econômicas que as separam umas das outras e opõem o seu modo de vida, os seus interesses e sua cultura aos das outras classes da sociedade, este milhões constituem uma classe. Mas na medida em que existe entre os pequenos camponeses apenas uma ligação local e em que a similitude de seus interesses não cria entre eles comunidade alguma, ligação nacional alguma, nem organização política, nessa medida não constituem uma classe

O povo da classe artística "em si" sente que mudanças lhes são adversas. Daí, resiste. Inteiramente compreensível. Mas não razoável. O Francis Gaury, diretor da OMPI, e necessariamente mais conservador do que a classe artística, acabou de dizer que sem mudar o direito autoral, “We risk losing our audience and public support if we cannot make understanding of the system more accessible.” http://www.wipo.int/pressroom/en/articles/2011/article_0005.html. Conservadorismo reflexivo de uma classe "para si". É preciso mudar para ficarmos na mesma.

Acho que já repeti bastante que não era nem sou completamente a favor da proposta anterior do Minc. Mas ela merecia discussão e impacto dos lobbies e dos interesses sociais no campo democrático do Congresso. Os episódios circenses da ministra relembram que "inteligentzia" não se traduz em "inteligência".

Tuesday, March 01, 2011

Desencosto

Lendo nos jornais de hoje que o barão Karl-Theodor Maria Nikolaus Johann Jacob Philipp Franz Joseph Sylvester von und zu Guttenberg foi demitido do cargo de Ministro da Defesa da Alemanha por haver plagiado sua tese de doutorado, me vi mais uma vez ante o que para mim é um enigma. Por que as pessoas plagiam?

Esta semana ainda se lê nos jornais brasileiros o caso do professor da USP, pego de ricochete pela cópia que fez uma orientanda sua, sem dar fontes, de material da UFRJ; outros casos existem em curso, envolvendo até mesmo grandes nomes de universidades de primeiro nível. Minha primeira experiência, quando cheguei ao INPI em 1979, foi de uma aluna de pós da FGV/Rio, que apresentou como sua monografia um manual da autarquia, e teve o azar de ser premiada pela excelência e publicada: o velho Afonso Arinos, diretor do curso, passou pelo que deve ter sido uma das mais incômodas tarefas de sua carreira ao vir pedir desculpas do Presidente do INPI. Como se fosse sua a responsabilidade. Em cada um desses casos (e em muitos outros, que o estatuto me impede de descrever) houve perda de cargo, perda de título, demissão de emprego, quando não tudo junto.

Bom, esses são fatos. Mas qual a explicação? Segundo uma linha analítica da Law & Economics, compreende-se a violação de um direito quando seu cumprimento seja menos ineficiente que sua satisfação, respeitados os interesses das partes afetadas (Robert Cooter and Thomas Ulen, in Law and Economics, 289-92, 1988, Scott, Foresman and Company) e que - na dúvida - é melhor soltar um culpado do que prender um inocente Posner, Richard A., Economic analysis of law, New York: Aspen Publishers,2007, pg 648) "... the asymmetric effect of the cost of imprisonment on convictions and acquittals means that it probably takes several erroneous acquittals to impose a social cost equal to that of an erroneous conviction." Ou seja, o ilícito e a sua sanção social passam por uma questão básica de eficiência.

Incluindo nessa equação o risco de ser pego, compreende-se que em 1979 o plágio fizesse mais sentido (além de que há sweat of the brow em ter que redatilografar tudo...). Mas hoje, a facilidade da cópia deve ser equivalente à facilidade do desmascaramento. Não é racional plagiar, do ponto de vista um barão alemão ou dos professores titulares que plagiam de seus orientados.

Resta o irracional. Perante um caso recente, e apavorante, envolvendo pessoas eminentes, disse a um colega do escritório, lembrando as aulas de medicina legal da UEG: ou é câncer na cabeça, ou sífilis ou PGP. Um colega que passa pela psicologia, literatura e direito dá outra explicação: isso ocorre muito no caso da perda de faculdades em quem foi brilhante e começa a empanar. Um drama vivencial e não doença de livro de medicina legal.

Mas aos poucos, ante casos tão inverossímeis e tão irracionais, começo a acreditar que a coisa não é problema para advogado de propriedade intelectual: tentem um pai de santo a todo tempo, alho como prevenção e uma bala de prata como repressão.