Monday, February 16, 2004

"A Justiça do Rio de Janeiro mandou suspender ontem a veiculação do
comercial da Schincariol que fazia comparação com outras marcas de
cerveja. A ação foi ajuizada pela AmBev, que se sentiu ofendida pelo
comercial da rival."


Reflexão: Quando uma empresa tm 68%do mercado relevante, o art. 54
da Lei Antitruste acende luz amarela em pisca pisca para qualquer
ação concorrencial relevante; há mais atenção, menos indulgência e um
presunção hominis de que os excessos são ilícitos. Isso, na
perspectiva do Direito Público da Concorrência.


A ação referida se passa no campo do direito privado da concorrência.
Da concorrência desleal, ou do mau uso de marca, como quiserem. Mas
não seria o caso, pela aplicação do interesse público da
competitividade, de se dar mais indulgência a quem tem 11 ou 14% do
mercado, do que entender uma isonomia formal?


Os limites entre o direito público e o privado da concorrência não
estão muito bem estudados; mas acho que por ai cabe lembrar a
excelente contribuição de Gustavo Leonardos:


. No entanto, pondera Gustavo Leonardos em A Perspectiva dos Usuários
dos Serviços do INPI em Relação ao Registro de Marcas sob a Lei
9.279/96. Revista da Associação Brasileira da Propriedade
Intelectual - ABPI Anais do XVII Seminário Nacional de Propriedade
Intelectual, 1997.:
"A publicidade comparativa que obtenha sucesso, não vai forçosamente
prejudicar a reputação ou integridade da marca comparada? Mesmo a
despeito da veracidade e correção da informação ou comunicação
publicitária (artigo 38 do Código do Consumidor)? Ou nesta última
hipótese poderíamos considerar que há uma inversão do equilíbrio
entre as garantias constitucionais previstas nos incisos IX ("é livre
a expressão da atividade…de comunicação") e XXIX ("a lei assegurará…
proteção… à propriedade das marcas") do artigo 5º da Constituição
Federal? Se afirmativa a resposta à última pergunta, podemos afirmar
que para se dar esta inversão favorável ao anunciante deverá ser
observada a prevalência do conteúdo informativo do reclame sobre as
demais mensagens, inclusive implícitas, de caráter emotivo ou
deceptivo. Caso contrário, haverá a validação da concorrência
desleal, do uso indevido de marca alheia, através da propaganda
comparativa."


A meu ver, Gustavo está certíssimo. Mas há um plano além, que resulta
de seu raciocínio: o de que o exercício da propaganda comparativa se
sujeita ao equilíbrio constitucional de interesses - dos quais a
garantia da competitividade e liberdade de iniciativa se contam como
essenciais. Assim é que vai minha proposta:


a) quando se avaliar concorrência desleal ou uso de marcas, os
interesses do direito público da concorrência podem ser tomados em
conta para sopesar a nocividade objetiva do comportamento da parte
tida por violadora.


b) é admissível uma maior agressividade de um concoorrente
minoritário, abaixo do limte legal dos 20% do mercado(mas não
falsidade ou fraude) numa situação em que um só conglomerado detenha
acima dos 2/3% do mercado nacional relevante.


Assim, se aplicaria a sugestão do Gustavo "prevalência do conteúdo
informativo do reclame sobre as demais mensagens, inclusive
implícitas, de caráter emotivo ou deceptivo", mas com uma graduação
mais matizada em favor do pequeno concorrente que quer nos dar, ao
público, o benefício de um pouquinho mais de concorrência.


A propósito, eu não bebo cerveja nem AmBev nem Schincariol. Uma ou
outra vez na vida, uma blanche de bruges, que a carne é fraca.....

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